Lágrimas da vida
Se tu souberas que lembrança amarga
Que pensamento 
desflorou meus dias,
Oh! tu não creras meu 
sorrir leviano,
Nem minhas insensatas 
alegrias!
Quando junto de ti eu 
sinto, às vezes,
Em doce enleio 
desvairar-me o siso,
Nos meus olhos 
incertos sinto lágrimas...
Mas da lágrima em 
troco eu temo um riso!
O meu peito era um 
templo - ergui nas aras
Tua imagem que a 
sombra perfumava...
Mas ah! emurcheceste 
as minhas flores!
Apagaste a ilusão que 
o aviventava!
E por te amar, por 
teu desdém, perdi-me...
Tresnoitei-me nas 
orgias macilento,
Brindei blasfemo ao 
vício e da minh'alma
Tentei me suicidar no 
esquecimento!
Como um corcel 
abate-se na sombra, 
A minha crença 
agoniza e desespera...
O peito e lira se 
estalaram juntos...
E morro sem ter tido primavera!
Como o perfume de uma 
flor aberta
Da manhã entre as 
nuvens se mistura,
A minh'alma podia em 
teus amores 
Como um anjo de Deus 
sonhar ventura!
Não peço o teu 
amor... eu quero apenas
A flor que beijas 
para a ter no seio...
E teus cabelos 
respirar medroso...
E a teus joelhos 
suspirar d'enleio!
E quando eu durmo... 
e o coração ainda
Procura na ilusão tua 
lembrança,
Anjo da vida passa 
nos meus sonhos
E meus lábios orvalha 
d'esperança!
  
Lágrimas de 
sangue 
Ao pé das aras no 
clarão dos círios 
Eu te devera 
consagrar meus dias; 
Perdão, meu Deus! 
perdão 
Se neguei meu Senhor 
nos meus delírios 
E um canto de 
enganosas melodias 
Levou meu coração! 
Só tu, só tu podias o 
meu peito 
Fartar de imenso amor 
e luz infinda 
E uma Saudade calma; 
Ao sol de tua fé 
doirar meu leito 
E de fulgores inundar 
ainda 
A aurora na 
minh'alma. 
Pela treva do 
espírito lancei-me, 
Das esperanças 
suicidei-me rindo... 
Sufoquei-as sem dó. 
No vale dos cadáveres 
sentei-me 
E minhas flores 
semeei sorrindo 
Dos túmulos no pó. 
Indolente Vestal, 
deixei no templo 
A pira se apagar - na 
noite escura 
O meu gênio descreu. 
Voltei-me para a 
vida... só contemplo 
A cinza da ilusão que 
ali murmura: 
Morre! - tudo morreu! 
Cinzas, cinzas... 
Meu Deus! só tu 
podias 
À alma que se perdeu 
bradar de novo: 
Ressurge-te ao amor! 
Malicento, da minhas 
agonias 
Eu deixaria as 
multidões do povo 
Para amar o Senhor! 
Do leito aonde o 
vício acalentou-me 
O meu primeiro amor 
fugiu chorando. 
Pobre virgem de Deus! 
Um vendaval sem norte 
arrebatou-me, 
Acordei-me na 
treva... profanando 
Os puros sonhos meus! 
Oh! se eu pudesse 
amar!... - É impossível! 
Mão fatal escreveu na 
minha vida; 
A dor me envelheceu. 
O desespero pálido, 
impassível 
Agoirou minha aurora 
entristecida, 
De meu astro descreu. 
Oh! se eu pudesse 
amar! 
Mas não: agora 
Que a dor emurcheceu 
meus breves dias, 
Quero na cruz 
sangrenta 
Derramá-los na 
lágrima que implora, 
Que mendiga perdão 
pela agonia 
Da noite lutulenta! 
Quero na solidão - 
nas ermas grutas 
A tua sombra procurar 
chorando 
Com meu olhar 
incerto: 
As pálpebras doridas 
nunca enxutas 
Queimarei... teus 
fantasmas invocando 
No vento do deserto. 
De meus dias a 
lâmpada se apaga: 
Roeram meu viver 
mortais venenos; 
Curvo-me ao vento 
forte. 
Teu fúnebre clarão 
que a noite alaga, 
Como a estrela 
oriental me guie ao menos 
Té o vale da morte! 
No mar dos vivos o 
cadáver bóia - 
A lua é descorada 
como um crânio, 
Este sol não reluz: 
Quando na morte a 
pálpebra se engóia, 
O anjo se acorda em 
nós - e subitâneo 
Voa ao mundo da luz! 
Do val de Josafá 
pelas gargantas 
Uiva na treva o 
temporal sem norte 
E os fantasmas 
murmuram... 
Irei deitar-me nessas 
trevas santas, 
Banhar-me na frieza 
lustral da morte 
Onde as almas se 
apuram! 
Mordendo as clinas do 
corcel da sombra, 
Sufocando, arquejante 
passarei 
Na noite do infinito. 
Ouvirei essa voz que 
a treva assombra, 
Dos lábios de 
minh'alma entornarei 
O meu cântico aflito! 
Flores cheias de 
aroma e de alegria, 
Por que na primavera 
abrir cheirosas 
E orvalhar-vos 
abrindo? 
As torrentes da morte 
vêm sombrias, 
Hão de amanhã nas 
águas tenebrosas 
Vos rebentar 
bramindo. 
Morrer! morrer! 
É voz das sepulturas! 
Como a lua nas salas 
festivais 
A morte em nós se 
estampa! 
E os pobres 
sonhadores de venturas 
Roxeiam amanhã nos 
funerais 
E vão rolar na campa! 
Que vale a glória, a 
saudação que enleva 
Dos hinos triunfais 
na ardente nota, 
E as turbas devaneia? 
Tudo isso é vão, e 
cala-se na treva - 
Tudo é vão, como em 
lábios de idiota 
Cantiga sem idéia. 
Que importa? quando a 
morte se descarna, 
A esperança do céu 
flutua e brilha 
Do túmulo no leito: 
O sepulcro é o ventre 
onde se encama 
Um verbo divinal que Deus perfilha 
E abisma no seu 
peito! 
Não chorem! que essa 
lágrima profunda 
Ao cadáver sem luz 
não dá conforto... 
Não o acorda um 
momento! 
Quando a treva 
medonha o peito inunda, 
Derrama-se nas 
pálpebras do morto 
Luar de esquecimento! 
Caminha no deserto a 
caravana, 
Numa noite sem lua 
arqueja e chora... 
O termo... é um 
sigilo! 
O meu peito cansou da 
vida insana; 
Da cruz à sombra, 
junto aos meus, agora 
Eu dormirei 
tranqüilo! 
Dorme ali muito 
amor... muitas amantes, 
Donzelas puras que eu 
sonhei chorando 
E vi adormecer. 
Ouço da terra 
cânticos errantes, 
E as almas saudosas 
suspirando, 
Que falam em 
morrer... 
Aqui dormem sagradas 
esperanças, 
Almas sublimes que o 
amor erguia... 
E gelaram tão cedo! 
Meu pobre sonhador! 
aí descansas, 
Coração que a 
existência consumia 
E roeu um segredo! 
... 
Quando o trovão 
romper as sepulturas, 
Os crânios 
confundidos acordando 
No lodo tremerão. 
No lodo pelas 
tênebras impuras 
Os ossos estalados 
tiritando 
Dos vales surgirão! 
Como rugindo a chama 
encarcerada 
Dos negros flancos do 
vulcão rebenta 
Gotejando nos céus, 
Entre nuvem ardente e 
trovejada 
Minh'alma se erguerá, 
fria, sangrenta, 
Ao trono de meu 
Deus... 
Perdoa, meu Senhor! 
O errante crente 
Nos desesperos em que 
a mente abrasas 
Não o arrojes p'lo 
crime! 
Se eu fui um anjo que 
descreu demente 
E no oceano do mal 
rompeu as asas, 
Perdão! 
arrependi-me!
Minha desgraça 
Minha desgraça, 
não, não é ser poeta,
Nem na terra de 
amor não ter um eco,
E meu anjo de Deus, 
o meu planeta
Tratar-me como 
trata-se um boneco....
Não é andar de 
cotovelos rotos,
Ter duro como pedra 
o travesseiro....
Eu sei.... O mundo 
é um lodaçal perdido
Cujo sol (quem mo 
dera!) é o dinheiro....
Minha desgraça, ó 
cândida donzela,
O que faz que o meu 
peito assim blasfema,
E' ter para 
escrever todo um poema,
E não ter um vintém 
para uma vela.